quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

O FIO DO TEMPO
Deixar Acontecer Natal
1. O Natal representa talvez dos maiores pontos de convergência no mundo actual. São raros os acontecimentos que conseguem uma unidade tão explícita em torno de um essencial objectivo comum. Embora havendo diferentes interpretações, até em termos de calendário e a que se podem juntar mesmo as dúvidas exegéticas sobre a data e o local do Natal original, a verdade é que cada ano este acontecimento consegue congregar e motivar para valores e sentidos de confiança e vida renovados. Não vale a pena salientar os excessos da quadra, pois esses acabam por ser um crescendo desmedido que se foi multiplicando ao longo dos séculos e das últimas décadas.
2. Ao passar os olhos pela arte ocidental, pela história da música, pela literatura poética, todas as artes foram brindando o primeiro Natal, como um acontecimento inédito e intemporal. Dar razões e raízes ao Natal é tarefa que cabe a quem compreende o sentido e a alma de dignidade que está presente no (re)nascimento de Belém. Deixemos acontecer o espírito de Natal, daquele universalismo acolhedor, luminoso, puro, sadio, saudável em que nos lembramos mais da noção solidária que deve habitar cada presépio do coração humano, multiplicando-se para cada dia.
3. Os tempos que correm precisam mesmo do que o Natal significa. Não propriamente toda a força publicitária que mantém a quadra viva (e em que neste aspecto o Natal não está em perigo, pois cada ano o marketing lança-se mais cedo). Mas aquela alma viva e sempre nova do Natal, que alia a memória do passado de cada um de nós ao nosso presente e nos projecta no melhor futuro possível. O Natal silenciou a utopia da dignidade humana ser divina; é divina, inultrapassável! O acontecimento do exemplar nascimento de Deus Menino, acontecimento teológico, revela-se perturbador mas restaurador definitivo da nossa condição humana. Na gruta de Belém ou no estábulo, a irreverência da simplicidade deixa-nos a pensar e quer-nos transformar! Mas para tal é urgente não perder a memória de razão e proximidade do único Natal de todos os tempos!

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

O FIO DO TEMPO
Nós e as redes sociais
1. Aquele caso da mãe que, passado cinco horas, veio anunciar ao Facebook o falecimento de seu filho, ajuda, com toda a verdade, a compreender os alcances do novo mundo digital. As redes sociais estão aí, todos os dias, a gerar o que de bom e de menos bom a humanidade tem. Com todo o realismo, não se pode querer o sol na eira e a chuva no nabal quando efectivamente estes meios de comunicação são reflexo da verdade diária do que acontece a cada momento. Talvez esta nova ordem da comunicação seja a maior revolução de todas em toda a história humana. O “tempo real” pode ser acompanhado como nunca por todos; para o “ar” do espaço público mundial pode vir tudo o que alguém quiser que apareça. Existam critérios, bom senso, pressupostos dignos e humanos naquilo que se põe no ar.
2. A certa altura pode-se dizer que nestas coisas das redes sociais, é um facto, tudo o que vem à rede é peixe! Isto é, o que aparece existe. Temos dificuldade em perceber se estamos preparados para o que der e vier, quando se sabe que, certamente, os registos em directo das graças ou das desgraças virão à luz do dia e estarão disponíveis continuamente na sociedade global. Quem não se lembra daquele caso da turma a desrespeitar a professora com gravação de aluno ao telemóvel e rapidamente disponibilizada na internet; quem não se lembra de… A verdade mais certa é a de que todos os mil e um instrumentos da comunicação não têm qualquer culpa do conteúdo que neles circula. Repense o utilizador!
3. Até quando esta viagem fantástica mas perigosa chegará? A partir de que momento estaremos no ponto de saturação? Como a aproximação global das virtudes mas das também diferenças vai conseguir fazer prevalecer a existência comum? Estará o mundo culturalmente preparado para a nova consciência global que cresce cada dia? Semear para colher, é o lema que dá razões à esperança no futuro. A mensagem «Feliz Natal» é a que enche o mundo virtual nestes dias. Seja cada dia!

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

O FIO DO TEMPO
As raizes da transparência
1. A «transparência» vai-se afirmando como um valor inalienável em ordem à clareza dos tempos futuros. A própria recente Cimeira de Copenhaga, nas suas ambíguas lutas de argumentação, trouxe para o cimo da mesa a necessidade de um realismo vigilante em termos de aplicação de decisões, caminho este que só é possível com a transparência, a partilha de informação, o sentido de bem comum. À medida que nos estados ditos de organizados a corrupção foi alastrando salienta-se, simultaneamente, o emergir de instâncias que vêm zelar pela responsabilidade esquecida. Novos e admiráveis passos de progresso técnico são dados cada dia, mas estes não conseguem travar a dificuldade de preservar os territórios da transparência e da verdade de não querer acima daquilo que é o “dever ser”. Planos inclinados…
2. Geram-se novos conhecimentos, ultrapassam-se as fronteiras das éticas e depois criam-se novas organizações pela defesa daqueles valores que deveriam de ser pressupostos numa sociedade dita de humana. Um dia destes demos conta em notícia da existência da Transparency International, uma prestigiada ONG (organização não governamental) que luta contra a corrupção. Este organismo está em fase de entrada e instalação em Portugal, um dos três países da Europa em que ainda não tem ligações. Esta entrada de Portugal vai ter direito a vir nas listagens internacionais, já que no mundo a Transparency International é a instância que publica o único ranking de corrupção mundial e que trabalha com a ONU.
3. Está fora de questão que é essencial todo o esforço purificador no sentido da verdade, da justiça e da transparência, isto é, verdade partilhada. Mas não existam dúvidas que tal como os valores fundamentais que dão sentido à vida não surgem por decreto, assim também o fim da corrupção não é algo que brote pela negativa (penalização do corrupto) mas pela consciência da ética e do dever de viver com os outros. Há raízes mais profundas que organizações ou decretos.

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

O FIO DO TEMPO
Dos fins aos princípios
1. Não é novidade que diante da tempestade é que se dá valor à bonança ou que quando estamos doentes é que damos mais valor à saúde. Esta experiência adquirida da vida diária haveria de ser transferida para patamares da ordem da saúde global dos grandes valores. Sendo interessante, não será necessário aprofundar obras paradigmáticas como «O fim da história e o último homem» (1992) de Francis Fukuyama ou a sua resposta no ensaio «O choque de civilizações e a recomposição da nova ordem mundial» (1996) de Samuel Huntington para nos apercebermos de que a temática da mudança de paradigmas pode ser comparada a um “fim” que abre novas janelas de compreensão de tudo o que nos rodeia. Não por se estar em final de ano 2009, mas se fizermos o corajoso exercício de nos situarmos nos diversos fins que poderão existir em termos pessoais, sociais ou globais, chegamos à conclusão de que é urgente relativizamos os acessórios e valorizarmos os grandes princípios.
2. Vem esta breve nota de reflexão a propósito do “vai-e-vem” que temos assistido na decisiva Cimeira de Copenhaga, acerca da questão inadiável da coragem em assumir medidas no que se refere às questões do ambiente. Torna-se complexa a aprendizagem deste exercício de considerar que é importante o pensar a sério sobre a sobrevivência da Humanidade, de ler como possibilidade que não é só “cinema” o que imensos documentários mostram como apelo ao arrepio enquanto há algum tempo. Cada vez mais que vamos observando que os grandes problemas (e os mais importantes situam-se nos terrenos dos “fins”) precisam de um olhar cruzado de todos os saberes (comprove-se a interdisciplinaridade assumida nas gerontologias…!), assim também sendo os pareceres técnicos fundamentais e decisivos para decisões políticas conscientes, a verdade é que os índices de SABEDORIA humana, serão o elo capaz de gerar o consenso salvador.
3. Sempre que se enaltece algum sentido acusatório (na Cimeira: pobres versus ricos), estamos longe da urgente (cons)ciência COMUM!

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

O FIO DO TEMPO
A sobriedade infantil
1. A quadra, nas propostas aliciantes de consumo, é de forte apelo à quantidade. Não faltam em todos os escaparates as mil e uma ofertas com as mais variadas vantagens para outras tantas situações em que o gerar do hábito e da necessidade é a arma mais poderosa. Ninguém está obrigado a comprar, é certo. Mas a designada sociedade de consumo tem neste mês o pico mais visível. A necessária educação para o consumo, no pressuposto lógico da “liberdade de comprar”, tem nestas quadras razões maiores para se justificar, mas estas são precisamente as alturas em que, mesmo sem qualquer generalização, a reflexão sobre os hábitos de consumo mais se manifesta infecunda. Gilles Lipovetsky, autor da Era do Vazio, na sua obra Felicidade Paradoxal (2008), bem tentou compreender os contornos do hiper-consumo.
2. A sobriedade nos tempos actuais reveste-se como um valor fundamental, pois ela traz consigo o importante discernimento entre aquilo que é o essencial e o que é o supérfluo que não interessa, o demasiado que atrapalha, fecha, cega e limita. Como reage uma criança diante de um castelo de prendas? Claro que diante dessa montanha russa de presentes deseja ao menos uma para sua satisfação! Sendo natural, não se pode deixar que a reflexão sobre os hábitos de consumos seja ela própria uma rotina em ciclo fechado. As desvantagens do exagerado e as vantagens da sobriedade simples que dá valor ao essencial e dá sentido à vida, precisam de ser destacadas. Como a onda que cresce, a publicidade incendeia o destinatário e o fermento gerador da necessidade cresce a ponto de gerar exclusões de consumo…
3. Tornando-se importante uma reflexão actualizada sobre o lugar da prenda de Natal (Natal?), sublinhe-se a urgência das idades maiores ajudarem os mais novos a pensar sobre as razões da festa e o porquê da necessária sobriedade de vida… A idade infantil actual não pode ser o novo deus intocável, descartada de qualquer índice de hábitos de sobriedade e simplicidade.

quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

O FIO DO TEMPO
O novo elogio da loucura?
1. Decorria o início do século XVI e a sociedade europeia vivia sobressaltos de nunca vista desumanidade. A exploração escrava de outros povos descobertos, o egoísmo da riqueza e as cruéis guerras religiosas no coração da Europa registaram nos anais da história das piores páginas de sempre. Neste duro ambiente, alguns grandes autores procuraram interpretar o seu tempo propondo caminhos a seguir de forma humana e digna. Algumas dessas grandes personalidades inscreveram-se no chamado pensamento da renascença, o qual proporcionou uma recriação actualizada das ideias e artes clássicas. Se o problema da sociedade da época era humano, estes autores apostaram na resolução da “questão antropológica” (ou seja, do repensar o agir humano).
2. Erasmo de Roterdão (1466-1536), essencial personalidade da renascença, escreve no ano de 1509 e publica em 1511, o famoso ensaio O Elogio da Loucura. Trata-se de uma obra, segundo especialistas, das mais influentes da civilização ocidental, sendo um dos catalisadores da designada Reforma Protestante. O Elogio da Loucura, em que a loucura é comparada a uma deusa, espelha os cenários de uma época controversa, através da sátira, do sombrio, da prática supersticiosa, da corrupção, da indignidade, do crime horrendo, num cortejo de miserabilidade sem limites. Tratava-se, fundamentalmente, do elogio de acontecimentos, posturas e coisas sem qualquer valor. Uma contradição, espelho de total vazio.
3. A que propósito vem esta temática? Há semanas quando dos rasgados elogios do presidente do Irão ao presidente da Venezuela, e deste ao presidente do Irão, lembrámo-nos do povo desses países e da estranha razão para tanto “elogio”. Decorria, então, a visita com “glamour” do presidente iraniano pela América latina, na procura jubilosa de angariar parceiros para a sua causa… Diz-se que a “questão antropológica” (sobre quem é o ser humano?) está na ordem do dia… Não há razões para tanto elogio, porquanto o estado do povo é que deve falar pelo líder…!
O FIO DO TEMPO
O hino de Ser Humano
1. Foi a 10 de Dezembro de 1948 que a Assembleia-Geral das Nações Unidas aprovou o “ideal comum a ser atingido por todos os povos”, a Declaração Universal dos Direitos Humanos (DH). Daí para cá este documento vivo que celebra 61 anos, foi sendo desdobrado em muitas outras declarações aplicando ao concreto os valores humanísticos universais nela contidos. Algumas diferenciações claras de fundo importará salientar: primeiro, que a presente Declaração dos DH não contém só “direitos” mas compreende-os numa leitura transversal de deveres e responsabilidades partilhadas; segundo, no exercício do diálogo desta Declaração com a (anterior) Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789), da Revolução Francesa e do erguer do Estado de Direito, esta última (um avanço em alguns domínios para a época) apresenta-se orientada para mais para os direitos de cidadania que para os direitos humanos.
2. A última diferenciação é clarificadora: os direitos de cidadania aplicam-se em países de cidadania legalmente organizada e com “cartões de cidadão”; já os direitos humanos são anteriores a qualquer Estado de Direito, fluem da condição e da dignidade da pessoa humana, esta que é fonte de esperança em nações onde o exercício das cidadanias está longe de ser visível ou então ilumina comunidades estatais legalistas para saberem ler mais alto e mais longe. Um outro aspecto vai sendo hoje sublinhado: a elaboração admirável da Declaração de há 61 anos, após a II grande guerra no centro da Europa, tem a marca civilizacional euro-Ocidental. Um grande valor partilhado universalmente, mas que na era da globalização pode resultar em limites de compreensão.
3. Desçamos ao concreto, como deve ser, e às grandes sensibilizações destes dias que em AVEIRO também assinalam este acontecimento. Em ampla parceria da Plataforma Aveiro DH (http://aveirodh.wordpress.com/), coordenada por algumas entidades, é a ser levada a efeito (convite aberto) a FEIRA DOS DIREITOS HUMANOS 2009 na Praça Marquês de Pombal.

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

O FIO DO TEMPO
Para que seja Natal
1. Já há longas semanas que os brilhos típicos da quadra de Natal estão nas ruas e avenidas por onde correm as gentes. Esta corrida reveste-se também da preocupação preparadora das festividades que se aproximam… Em termos de efemérides, o próprio mês de Dezembro mostra-se sensibilizante em termos de causas e valores natalícios a assumir: dia 3 de Dezembro foi dia (para que o seja todos os dias) dedicado à pessoa com deficiência, dia 5 enaltecedor dos Voluntários (Dia Internacional dos Voluntários) e dia 10 será o grande dia dos Direitos Humanos, também em Aveiro assinalado com um conjunto de iniciativas e sensibilizações. Já em finais de Novembro, início de Dezembro, havia ocorrido a campanha do Banco Alimentar contra a Fome.
2. Torna-se importante, no mundo especializado em tantas ligações tecnológicas, ligar o que de humano e bom existe; promovê-lo e enaltecê-lo para que cresça cada vez mais e diminua aquilo que são as “ervas daninhas” de qualquer comunidade social. As referências de iniciativas em rede multiplicam-se e procuram interpretar o mês do Natal como um eco para todos os dias dos meses e dos anos. Querendo esta quadra no plano das ideias, a partir da raiz única do Natal de há 2000 anos, gerar a vivência da igualdade em termos de dignidade humana (que reflecte a divina), a verdade é que a persistência prática das desigualdades faz com que o contraste se avolume na época do Natal. Todos os gestos tão sensibilizantes para tantas situações de “frio social” acabam por ser sempre pequenos para problemas tão grandes e problemáticas…
3. Verificam-se nestes dias essas preocupadas corridas de preparação do Natal gordo em que não há tempo para o gesto (seja global!) que suavize e promova para a autonomia e dignidade a magreza do sem lar, sem pão, … A autenticidade do Natal verdadeiro será sempre desconcertante; este tem mais dificuldades em conseguir fazer passar a mensagem. Quem dera que a grandeza de tantos gesto de tanta gente fosse o milagre do Natal universal. Preparemo-lo, melhor, sejamo-lo! É essa a maior luz!

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

O FIO DO TEMPO
A fuga ao fracasso?
1. Aproximam-se os dias da verdade sobre o que queremos (ou não queremos) em relação ao futuro da Humanidade. Já há muito que as questões ambientais deixaram de ser uma “moda” de modernidade ou tidas como algo de “esquisito” em relação à normalidade; aliás, para haver normalidade e futuro respirável cada cimeira ou encontro sobre as alterações climáticas vão sendo passos que se afirmam decisivos e inadiáveis. Decorrerá de 7 a 18 de Dezembro a Cimeira de Copenhaga, de onde se espera que saia o novo acordo global sobre as questões ambientais, vindo substituir o Protocolo de Quioto (1988). A pressão cresce em todos os quadrantes. Sublinha o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, que seria «moralmente indesculpável» o fracasso da Cimeira que está a chegar. A-ver-vamos…!
2. É verdade puríssima que os índices de responsabilidade cresce à medida que a ciência e o conhecimento vão demonstrando a evidência dos factos; é «verdade inconveniente» (Al Gore, 2006) que não se poderá ver com olhar simplista um processo de mudança de comportamentos e atitudes, mas que urge mudar estabelecendo padrões de vida sustentável, o que se vai confirmando como a única tábua de salvação. As alterações climáticas, no dizer de Ban Ki-moon «são a questão dominante da geopolítica e economia mundiais do século XXI, uma questão que afecta a equação mundial do desenvolvimento, da paz e da prosperidade.» Diremos que se não vamos lá (por um humanismo saudável e) pela via “razão”, teremos de ir mesmo pela estrada da tempestade e do medo.
3. Desconcertante é a afirmação do “pai” dos alertas das alterações climáticas, James Hansen, quando ele diz em entrevista ao The Guardian que «é preferível que a Cimeira de Copenhaga falhe». Talvez Hansen diga isto para alarmar, sabendo como são as boas (mas estéreis) intenções; ele considera este ser «o desafio moral do século». Tem razão, ou não dê a própria sobrevivência (em causa) razões para repensar a vivência!

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

O FIO DO TEMPO
O fenómeno Dudamel
1. Não é nenhum jogador de futebol genial, mas vive a música como se de um jogo admirável se tratasse. Vale a pena parar diante deste maestro venezuelano de 28 anos apenas que tem o mundo a seus pés. Gustavo Dudamel é hoje sinal do poder que a música pode ter no que se refere às virtualidades de transformação social que a arte transporta. Criador do que ele chama o «sistema» musical na Venezuela, viu que para as crianças dos bairros mais pobres o carregar do violino e clarinete, o estar em ensaios de saber ouvir em grupo, o acolher a inteligência emocional da melodia, tudo isto poderia ser um pólo de motivação sem precedentes para a própria vida diária, em ordem à implementação da confiança no futuro. O nome de «Dudamel» já é uma poderosa imagem de marca que se vai estendendo por muitos países do mundo inteiro...
2. Tendo Dudamel neste 2 de Novembro estado em Portugal, na Fundação Gulbenkian para dirigir a Orquestra Juvenil Ibero-Americana, o maestro vive os seus dias entre a visibilidade mediática de Los Angeles, o “retiro” de Gotemburgo e a sua casa natal da Venezuela, que nunca abandonará. No mundo musical todos os querem pela sua energia única; aclamações são imensas: de personalidades que dizem que casos como Dudamel «surgem em cada cem anos», até ao próprio génio maestro Daniel Barenboim para quem «Gustavo tem um talento sem limites». A sua chegada em Setembro último para dirigir a prestigiada orquestra de Los Angeles marca o ponto sem retorno que deixará na história da música gravado o nome Dudamel.
3. À nossa cultura musical, ao potencial que a música poderia ser para aprender matemática, ao lugar dado às personalidades com capacidade de influência nas opções pela música no mundo da escola formal ou informal, a todos os têm capacidade de se deixarem sensibilizar com a arte, a poética e a música... faz bem conhecer histórias de vida em «Sol +» como Dudamel, não só pelo génio pessoal, mas pela capacidade (trans)formadora social.
O FIO DO TEMPO
1640 e a actualidade
1. Existem datas históricas que, por motivos vários (mas normalmente pela heróica capacidade superadora das limitações), fazem parte da memória viva das comunidades nacionais e/ou mesmo da própria comunidade internacional. Na história de Portugal o acontecimento da Restauração da Independência (1 de Dezembro de 1640) escreve uma página em que pelos relatos da época a heroicidade saiu vencedora da própria lógica racional pessimista, pois onde é que de um país já na altura tão “pequeno” poderia haver tanta força para superar as vizinhas armadas; quer a espanhola, quer a “armada” paralisante da pessimista visão lusitana que por esse tempo começou astronomicamente a crescer arrastando consigo os séculos seguintes.
2. Mesmo sem os providencialismos mitológicos que poderiam conduzir a outras reflexões, a verdade é que, após o desvio do planeamento estratégico que está na matriz dos portugueses – o «globalismo» – para as “areias marroquinas” que liquidaram D. Sebastião (1578) em Alcácer Quibir e abriram a Batalha da Sucessão, da crise reinante pelos tempos de 1640 as gentes do povo português souberam construir terreno fértil e tirar partido das conjunturas para ser possível a Restauração de «1 de Dezembro de 1640». Sublinham os estudiosos dessa conturbada época que: 1º, a nobreza portuguesa no geral e por razões de comodidade, estava orientada para o reinado ibérico (da fusão Portugal – Espanha); 2º, um homem providencial (Pe António Vieira) conseguiu alimentar a alma das forças vitais diante da frágil independência, esta que só se deu por formalizada após 28 anos (1668).
3. Há dias, ao ouvir o Prós-e-Contras sobre a crise das finanças nacionais, as suas questões estruturais que se arrastam, veio à memória esta história que nos precede em acontecimentos “gloriosos”, mas que nos persegue numa limitação de implementação histórica de tantas excelentes ideias (irrealizáveis). Um novo realismo social poderá salvar-nos? O nome do Povo é sociedade civil.