quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

O FIO DO TEMPO
Mais próximos que nunca, mas
1. É impressionante a velocidade a que crescem as formas de comunicar. Os instrumentos e os formatos da comunicação brotam como cogumelos. Quem hoje tem dez anos nunca imaginou que um dia a televisão foi a preto e branco, ou que muitos séculos vivemos sem os telemóveis. A super abundância de instrumentos seduz a habilidade de os manusear. A competição entre as novas gerações não são tanto sobre quem sabe de “saber” mas de quem sabe “mexer”. A habilidade de manuseamento tecnológico está tornada a nova “ciência”, ficando propriamente o conteúdo mais para trás. Está patente aos olhos de todos, até pelos piores motivos de tragédias naturais ou humanitárias, que pode faltar tudo o resto menos a informação multi-proveniente, esta cada vez faltará menos (há sempre um telemóvel a gravar), será abundante, cabendo ao “leitor” organizá-la.
2. Após esta expansão imensa dos alcances informativos e dos mil e um instrumentos utilizados, é hora do reforço da aposta na qualidade e na grandeza do conteúdo que se transmite. Como é possível esta aposta na qualidade se a avalanche de equipamentos cresce de dia para dia? Será possível ensinarmos e aprendermos que mais que o equipamento vale o conteúdo, e que o equipamento só vale efectivamente se for ao serviço do conteúdo? A aproximação do mundo em relação a si próprio e às suas imensidões de diversidades é o desafio para o século XXI. Pelos instrumentos somos conduzidos ao encontro uns dos outros; mas uma clara impreparação em termos de conteúdos culturais será hoje o grande «calcanhar de Aquiles» que relança todas as incertezas quanto à capacidade de viver com os outros que são diferentes.
3. Dos média mais antigos à internet supersónica, do telefone clássico ao equipamento pessoal omnipresente cada vez mais potente e pequeno, podemos acompanhar o mundo e entrar em todo o lado. Mas com que qualidade o fazemos? Como preservar a individualidade nesta (com)vivência? Ainda não sabemos avaliar todos os impactos deste novo mundo, mas que ele nos exige bem mais atenção lá isso é bem verdade.
O FIO DO TEMPO
Escutas e valor confiança
1. A última notícia sobre as desconfianças da justiça é reveladora do estado de sítio em termos da estrutura profunda da justiça. A proposta surpreendente vem de quem vem. Não foi um cidadão comum que a sugeriu mas a coordenadora do Departamento Central de Investigação e Acção Penal. Procura-se combater o crime da violação do segredo de justiça com um generalizado e preocupante lançar de suspeita sobre o próprio sistema de justiça. Sentir-se razões para esta proposta faz tremer um país. Este ciclo fechado em que está tornada a “causa da justiça”, revelando incapacidades estruturais demonstra que se torna bem difícil descortinar o caminho da seguir.
2. O verniz parece estalado de vez. O bastonário dos advogados também vem defender escutas a polícias com a finalidade de combater o mesmo mal das fugas ao segredo de justiça. Caminhamos para uma generalização da escuta para tudo e para nada que vai tornar a vida social um preocupante big brother? Esta polémica instalada mostra a ponta do iceberg em que se corre o perigo da generalização da ideia de que não vale a pela lutar por uma sociedade de confiança. O futuro que é aberto por este “escutar” aos que governam o barco da justiça coloca diante do horizonte uma negra nuvem…
3. O valor “confiança” é um valor estrutural para a convivência em sociedade. Talvez as estruturas da sociedade andem sem os essenciais alicerces. Sem o aprofundamento dos valores humanos e da dignidade da pessoa humana, e das vantagens para todos no erguer a confiança como um pilar para haver futuro melhor, sem esta alavanca a “casa” não parece que tenha ordenança possível. Às referências penais propomos mais penalização e desconfiança até á exaustão? Com realismo, haverá futuro sem confiança?
O FIO DO TEMPO
Um país humanitário
1. A situação aflitiva da Madeira, que faz de todos nós madeirenses, a par da concomitância da candidatura de Fernando Nobre à presidência da República, os temporais que têm assolado também a nossa região com os consequentes estragos, parece que fazem parte do mesmo acontecimento temporal da visibilidade humanitária de um país que, mais que nunca, agradece e faz de todos “bombeiros” no socorro das aflições. Nestas ocorrências de tragédia, o realismo organizado puxa pelo melhor de todos, e na hora da urgência não pode haver separações de qualquer cor. Da aprendizagem destes tempos humanitários é importante o seu perdurar para que a memória não apague nem a consciência da pequenez humana diante da grandeza da natureza, nem a consciência de um nacional ordenamento do território que importa na generalidade repensar.
2. A hora é solidária, os outros que sofrem podemos ser sempre nós próprios. Também é momento de pensar, reflectir, interiorizar, fazer silêncio pela memória… Não é hora de “jogatana” política, da desejosa procura da atribuição da culpa, da intriga que manifesta a mesma pequenez do ser humano diante da gigante tempestade. O que seria “se”, e “se”… Quem não se lembra da tragédia da ponte de Entre-os-rios? Então, isso sim, do que depende de nós, vamos avaliar tudo preventivamente para tudo restaurar com eficácia antes que a casa “seja assaltada”. No depois das “trancas à porta” é sempre fácil discursar, dividir para reinar, distribuir responsabilidades por outrem, jogar conforme ao jeito e à circunstância. O que porventura falta às entidades formais no zelo da cultura preventiva não é diferente do que nos falta como pessoas informais diariamente.
3. E veio a candidatura do fundador presidente da AMI (Assistência Médica Internacional) à presidência da República. Alegre político reagiu a Nobre humanitário. Dois modelos de interpretação e acção diante da realidade. O nosso povo, humano e solidário, sempre será soberano!
O FIO DO TEMPO
A demissão climática
1. É notícia fresca a demissão do negociador chefe da ONU para o clima. O fracasso da Cimeira ambiental de Copenhaga de há dois meses trouxe para o cimo da mesa a verdade dura e crua da dificuldade em implementar a mudança. Yvo De Boer – destacam os que agora o vêm partir para novos desafios – fez um trabalho formidável na política global para a questão das alterações climáticas. A decisão foi «difícil», mas inadiável; De Boer, deixando o cargo a 1 de Julho, vai-se dedicar à outra face da luta pela questão ambiental global: a luta pelo lado educativo e empresarial. Defensor de soluções mais reais que as da lógica política dos princípios teóricos, passará a trabalhar com diversas universidades e deseja envolver empresas e comunidades nos projectos ambientais.
2. A Convenção das Nações Unidas sobre a Mudança Climática, na pessoa de Eric Hall, manifesta a surpresa e estranheza pela notícia da decisão e reconhece-lhe o papel de liderança, apesar de tudo, nos progressos das negociações desta área tão decisiva quanto ao futuro. Yvo De Boer parte da instância suprema das Nações Unidas para trabalhar com o sector empresarial, o que mais polui… Desafio que faz descer os princípios às práticas no acompanhamento real e realista das problemáticas do ambiente. Fica no ar a pergunta sobre se foi a “frustração” da Cimeira de Copenhaga que o conduziu à demissão da responsabilidade assumida nas Nações Unidas.
3. Três ideias força, consideramos, haverá a reter: 1. A verdade da força da liberdade de quem luta pelas causas na sua raiz, nada o deixa prender aos “lugares” importantes; 2. A urgência da aposta educativa que norteará alguém que passou pela experiência das tensões e rejeições da grande Cimeira de Copenhaga, esta resultará em sabedoria que implementará visões e práticas inovadoras; 3. A certeza de que as questões climáticas, na sua urgência global, começam a entrar nesta gama de notícias e “transferências” ainda que elas na demissão mostrem o mau “estado da arte”. Talvez este “safanão” ajude à orientação de um futuro mais sustentável na prática (?)
O FIO DO TEMPO
Aprender a viver com a crítica
1. É natural que ninguém gosta de receber críticas, mas saber conviver com elas revela-se uma atitude de prova de maturidade e de consciência de que cada dia se está a aprender. O terceiro pilar do relatório da educação para o século XXI, «aprender a viver juntos» continua a ser uma meta a atingir que por este mundo fora insiste em fazer correr muita tinta e infelizmente, também, muito sangue. A imposição das ideias de uns sobre outros, a par do deixar-se “agarrar” à ilusão do poder das coisas ou dos lugares deste mundo, tem sido e continua a ser, um dos grandes entraves à saudável e necessária convivência humana, onde todos temos sempre tanto a aprender uns com os outros.
2. Também é verdade que determinadas responsabilidades são da ordem da confiança, da delegação, implicam a necessária coesão em que se torna bem mais difícil compatibilizar a posição da “diferença” com um pensamento de unidade no essencial. Mas é mesmo aqui que estará o segredo da vivência em sociedade democrática; ninguém tem a verdade absoluta, pois que esta é projecto comum; também ninguém tem o direito de viver continuamente de forma “criticista” pela negativa, como se não existissem valores nas propostas apresentadas por outros. Especialmente quando existem incompatibilidades entre a opção A e a opção B, vem ao cimo a necessidade de uma boa fundamentação, pensada clarificação, aberta transparência, a ordem da racionalidade como justificativo integral. Quando o reinar se vai fechando e de umas paras as outras existe falta de clareza e clarificação, é natural que comece a pairar a desconfiança não como excepção mas como a regra.
3. O Portugal a que chegámos é o país que todos cada dia construímos. A história de Portugal está cheia de momentos de inspiradas aberturas ao universalismo mas também de páginas fechadas às diversidades dos outros; momentos e regimes de forte expansão pluralista e outros que liquidaram os que pensavam diferente. Libertemos a crítica com autocrítica ao novo compromisso!

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

O FIO DO TEMPO
Dar vida positiva e tempo ao tempo
1. Após as festividades carnavalescas, embora este ano bem mais frias mas sempre com alguns excessos típicos da quadra, o convite a regressar ao rigor dos trabalhos alia-se à necessidade de desenvolver aquilo que são caminhos e horizontes de esperança. Como em todos os tempos, também neste não faltam motivos e motivações para o travão fazer tardar as boas novidades e o ressurgir de uma vida melhor, de um progresso mais justo, de vidas mais solidárias e mais felizes. Neste campo, até pela aprendizagem que a vida sempre ensina, teremos que desconstruir aquela ideia de que o pior é onde chegámos agora e de que se chegou ao beco sem saída. Quer à luz da história dos séculos, quer na vida pública da sociedade actual, é injusta essa consideração de que chegámos ao pior dos piores…
2. Sabe-se que uma coisa é viver com sentido e outra será o sobreviver. À sobrevivência pertencerá não só a luta mesmo que aflitiva pelo dia-a-dia como também uma desmotivação paralisante; à vivência com sentido cabe tudo o que são o vislumbrar das luzes no meio da escuridão, o captar a intuição do caminho a seguir, o perscrutar a oportunidade mesmo no cenário real da crise. Nos dias de hoje, mesmo e especialmente diante de todas as desmotivações que podem gerar muralhas de inércia, valerá a pena repetir um refrão bem alto: quem cultiva cada dia o sentido da vida é bem mais forte e mais capaz de persistir na confiança do que quem não dá o mínimo tempo nem tem lugar na vida para cultivar o jardim da sua existência.
3. A pior doença de todas está centralizada no Ser profundo; por isso diz-se que o sistema nervoso (da neurologia pessoal) anda afectado, agitado com os vários “stresses”: uns justificados pelo mundo em que vivemos, outros por motivos de várias ordem e mesmo alguns que bem poderiam ser evitados. Recomecemos por aqui, por aquilo que pode ser melhor e que depende de nós; existirão ecos de luz que brilharão na vida pessoal e social. Para alguns a Quaresma – um tempo de parar e reparar, dando tempo positivo e esperançoso ao tempo da vida – também quer ter estes efeitos de saúde existencial e comunitária.

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

O FIO DO TEMPO
Nas malhas da liberdade
1. O tecido social da comunidade só consegue fluir criativamente no princípio basilar da liberdade. Esta liberdade, em sociedade de democracia amadurecida, revela-se como o pilar estruturante que garante o exercício da pluralidade e da respeitosa tolerância. Conseguir conviver com a diferença de opinião, de ideia, crença, política, visão estratégica, eis os sinais claros de que a liberdade é nossa companhia constante e que esta preserva o exercício público de todos e o particular de cada um. No século XX, à medida que os poderes da comunicação foram crescendo, estes foram sendo um palco preferencial do exercício da opinião, conveniente quando vem a favor, inconveniente, quando a opinião não é favorável. Estamos a navegar em terrenos muito pantanosos, onde as fronteiras da liberdade devem coexistir com as da responsabilidade colectiva.
2. Não é preciso recuar muitas décadas de tempos idos para nos apercebermos dos poderes e contrapoderes que se combatem entre si, a ordem política e a comunicação social. A primeira usa a segunda na propaganda publicitária e anunciadora, mas quer silenciá-la nas horas denunciadoras do mau governo. O castelo de acontecimentos recentes no nosso país – que jamais se poderão silenciar – está num ponto de crescimento impensável. Já após o “alegadamente”, a rede do controle nos seus tentáculos sombrios terá atingido proporções que aprisionam a desejada liberdade de opinião, o mesmo é dizer, liberdade de existir em sociedade. “Nem ao mar, nem à serra”; sendo de pressupor todos os contraditórios e todas as justificações, a verdade é que nada poderá justificar um beliscar que seja a liberdade de informação.
3. O apocalíptico caso da “escutas” já não sabe se se consegue escutar a si próprio, cheio que está de tanto ruído que parece não só não ter fim, como vai-nos conduzindo ao precipício, atacando por todos os ângulos da questão as malhas da liberdade. Não se sabe e ninguém sabe o que fazer: é o pior. Pelo andar, são naturais os medos: estes, espelham a não liberdade? Há condições para continuar(mos)?
O FIO DO TEMPO
O fim do pessimismo
1. Percorre a seiva da opinião dominante nos principais meios de comunicação uma sensação de pessimismo que em nada conseguirá resgatar a vontade positiva para a vivência de cada dia. Ainda há dias a folhear um jornal de boa reputação, ao percorrer as páginas e as várias visões e opiniões, a conclusão a que se chega é que tudo parece negro, frio, negativo, feio, não havendo quase “ponta” social por onde se lhe pegue. O pessimismo partilhado pelas mais altas gerações, mesmo que com a dose de realismo justificada, tem efeitos nefastos nas mais novas gentes que estão a abrir os olhos para este mundo.
2. É verdade que jamais saberemos quantificar o impacto e o efeito negativo de toda a onda pessimista que se atrai a si própria podendo conduzir ao imobilismo de que já nada vale a pena fazer. Talvez entre tantas razões de pessimismo estará o facto da chamada sociedade dita de bem-estar a certa altura se ter atribuído a si própria seguranças acima das realidades e contingências; e se fossemos ver por esse mundo fora a verdade humana para além de nós mesmos, mudaríamos muito de opinião, sem que isto sirva de conformismo ao deixar estar como está ou então a dizer-se aquele refrão que como os males de outros se pode sempre bem…!
3. Por vezes alguns historiadores que percorrem os séculos do nosso país, lêem determinadas passagens do passado longínquo e parece que foram escrita para hoje. Uma torrente de pessimismos têm arrastado a memória colectiva que parece gerar o desconcertante diante do compromisso de todos os dias. Ar fresco e inspiração, precisa-se! A capacidade do positivo e da esperança, sem ocultar a realidade como ela é para a transformar, é um valor fundamental. Urge implementar a cultura do bem, das boas práticas, das boas acções, da promoção de tudo o que edifique… Antes que esse rasto do “péssimo” feche a esperança da mente dos mais novos…
O FIO DO TEMPO
E o tempo depois…?
1. Em todos os níveis daquilo que é uma vida intensa de trabalho, existe sempre um depois… O “depois” do jogo, da corrida, do exame, do labor árduo; o depois onde fica o verdadeiro sentir do que se aprendeu e do que se cresceu com a experiência de vida. Na medida em que o caminho é construído com um conjunto de valores e referências positivas, assim tanto mais o “depois” será o colher dos frutos da sementeira que se plantou. Mas valerá a pena debruçarmo-nos sobre o “dia seguinte” após longos dias de trabalho, a idade em que se entra na chamada reforma.
2. Há tanto de bom para fazer neste mundo que todas as idades e em todas as circunstâncias todos os corações disponíveis são convidados a colaborar para o bem da comunidade. Tudo porque se torna essencial dar valor e sentido positivo à vida e ao tempo da vida. O pior que poderá acontecer será ter tempo livre em excesso, não dar alma construtiva aos minutos e às horas, pois que até custa o passar do tempo quando ele não é válido para si e para outrem. Hoje, também neste novo contexto em que uma nova multidão de pessoas vão entrando na idade da reforma, existem um conjunto vasto de programas de voluntariado, de acções solidárias, de empenhos na construção do bem comum porque se lutou cada dia.
3. Mas, uma verdade é bem nítida: o “tempo depois” será tanto mais válido quanto mais no tempo antes e durante os anos fortes da vida a pessoa se abriu a dimensões sociais e comunitárias. Neste terreno a liberdade pessoal é o lugar definitivo onde se constrói o principal tesouro; por muito que a ajuda de outrem exista no despertar dessa abertura de espírito, a verdade é que esta não entra no campo das obrigações... Só há vantagens em irmos abrindo a nossa vida a novas dimensões comunitárias. Num tempo em que alarga o leque de pessoas que entram nesta nova fase da vida, valerá a pena ampliar esta compreensão global e mesmo estudá-la.
O FIO DO TEMPO
De um país à Humanidade
1. Na abertura do ciclo de Grandes Conferências da Fundação Calouste Gulbenkian esteve em Lisboa Tara Gandhi, neta de Mahatma Gandhi (1869-1948). Escutada atentamente, seduziu pelas suas meditadas palavras da paz pela não-violência. Destacou a “poluição da mente” que persiste, falou sobre a construção da democracia e o silêncio humano necessário como reflexão e meditação sobre a nossa condição sobre a terra. Portadora da herança de seu avô, ela destaca que o pior dos males do mundo não é o ódio mas sim o «medo»; é este, no seu dizer o contrário do amor.
2. Acolhermos o testemunho de quem vem da raiz da paz indiana é sensibilizante e quer mover ao compromisso histórico em viver os mesmos ideais. Interessante o universalismo da mensagem quando a neta diz que «Gandhi não pertence à Índia mas a toda a humanidade».
Diante do mundo onde os processos de vivência e decisão são hoje bem superiores à clássica ideia do Estado-Nação, a necessária consciência de pertença à comum humanidade sai reforçada e a democracia como “convivência” acaba por se transformar em alta responsabilidade global. É neste domínio que um país (como uma pessoa) que se fecha ao mundo fecha-se a si próprio. O contrário também.
3. Os medos e a chamada poluição da mente são os principais obstáculos ao destino humano comum. Ensinar e aprender a liberdade é missão que exige todos os contributos. Nenhuma área do conhecimento deve ficar de fora. Quando nos perguntamos sobre as principais “feridas” dos países que constituem a Humanidade também haveremos de procurar as principais soluções iluminadoras. Nestas, no dizer de Tara Gandhi, também a cultura e religião, a qual «é uma forma de nos unirmos aos outros, para descobrirmos mais sobre nós próprios». Eis uma chave do século XXI.

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

O FIO DO TEMPO
A corrente do sistema
1. Há dias uma imagem aa televisão, vinda da China, impressionou quem se deixa impressionar. Era um pai que, tendo-lhe sido roubada a filha mais velha, pegou no filho mais novo, de seus três anos, e amarrou-o com uma corrente a qualquer coisa fixa, não lhe fosse acontecer o mesmo destino trágico. O pai partilhava o desespero da insegurança, mas com a naturalidade de quem já está habituado à desumanidade. Tudo acontece na China, sistema que se vai afirmando com importâncias na cena internacional, mas no retrato nacional sofre os abalos de tamanhas condições de indignidade. Dizem os números, que não se podem calar, que são na ordem das cem mil crianças ano raptadas para os vários tráficos (de órgãos, de crianças, de prostituição) que persistem na era da globalização.
2. E o mundo assiste a este rodopio de notícias, esta como tantas outras, em que correntes de sistemas aprisionam pessoas e nações. Uma lei perturbadora também reina nestes acorrentados: a de que alguns países entusiasmados em conquista de figurantes de primeira linha na cena internacional, nesse processo vistoso, crescem por dentro no doloroso caminho até lá chegar. São gerações de mártires deste género, na China como noutras paragens, em que à distância “tudo” o que podemos fazer é quase-nada, a não ser ter compaixão, sofrer com quem sofre e mas ampliar o leque dos que não se conformam. Se a comunicação do mundo actual nos aproxima do que antes era obscuro, a nossa correspondência haverá de ser libertadora de cada opressão.
3. Mas, ainda, o pior de tudo é matar à raiz uma nova vida. Se os adultos não se entendem e trocam galhardetes ente si, tenham na sua capacidade de resposta adulta os argumentos com que se defender. Mas aquela(s) criança(s) chinesa(s), vítima(s) do sistema e das correntes que ao mesmo tempo aprisionam mas que garantem a perturbadora segurança… essa criança no seu olhar deixa-nos a pensar que mundo violento os grandes deixam aos mais pequenos. E depois, eles serão o que hoje formos…? Esperemos que não!

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

O FIO DO TEMPO
O verniz e o cinto…
1. Chegámos a um momento muito difícil. Sente-se o verniz a estalar e continua certa a garantia do apertar do cinto. Quem viveu períodos como este (e mesmo quem não viveu) sente que o futuro tem um reforço de incertezas como já não se sentia há muito tempo… O caso da lei das finanças regionais e todo o xadrez de pressões, intenções primeiras, segundas e terceiras; a crise social instalada, o aumento transversal da precariedade, as pessoas do desemprego histórico, a criminalidade e insegurança que se confirma cada vez mais diária; a nossa comparação com a Grécia e a galopante não credibilidade externa; a escassez de horizontes políticos que enfermam um diálogo que todos reclamam mas que “todos” falham; a sensação de que a liberdade de opinião se sente ameaçada com sucessivos casos de “alegadas” pressões e de “problemas” a serem resolvidos…
2. Um criticismo sistemático dos males que nos atormentam que impedem de ver uma luz em céu aberto; a ideia de que se formos mesmo perguntar o que os portugueses pensam sobre «saúde, cultura, educação, justiça, história, rigor, método, empreendedorismo, política», diante destas e de outras tantas outras ideias estimulantes ou áreas sociais essenciais a sensação de que entre a indiferença ou o dizer mal é o pântano generalizado preferencial; a verdade de que apatia e descompromisso atraem a desmotivação, ambiente este que conduz a novas multidões de emigração diante de um país truncado (porque o truncámos!?); a noção de que carecemos: 1º, da autocrítica de revisão em ordem ao progresso diário e 2º, da nobre responsabilidade de cada um para se assumir todas as consequências, preferindo-se a vitimização preguiçosa ou a desculpabilização.
3. Claro que tudo o que apresentamos acima não é nada de novo, nem nada de verdade; ou outras vezes é tudo de verdade e ainda será pior; de extremos e de verniz estalado e de cinto apertado. Tudo simbólico o que escrevemos; só uma verdade: os habitantes de um país são os que o constroem; o mal que se publicita volta ao ponto de partida, sendo perca de tempo. Mas, efectivamente, diante de tantas crises, o que o país menos precisava era do que se vê; excepto aquela sugestão de baixar até ao “valor X” as grandes reformas e os irrazoáveis salários “pagos” pelos cintos apertados. E esta!?

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

O FIO DO TEMPO
O fenómeno Avatar
1. Ninguém duvida da força do mundo da imagem, dos impérios dos cinemas, do quanto eles reflectem, de um modo ou de outro, a realidade do mundo que vivemos; os seus bens ou os seus males, as suas angústias e aspirações. É uma multidão de actores imortalizados, e é um mundo que acompanha continuamente os desenvolvimentos da sétima arte, o cinema. As mais famosas películas cinematográficas são espelho de culturas e crenças, retratam momentos históricos decisivos, partilham mundialmente as mais belas paisagens; abrem-nos ao mundo do imaginário, digital, ficção, fazendo-nos ver o invisível. Mas também o cinema reflecte a violência que vai nos corações, a inveja e a corrupção que persiste, podendo quase ser uma sedutora escola de crime.
2. Quanto ao mundo do cinema, dir-se-á, nem o elogio nem o desprestígio; mas todo o cuidado, atenção e zelo em termos da inevitável impressão que a imagem grava do olho e na mente humana. Há filmes que apelam ao melhor e ao pior; cenários humanos que fascinam e outros que são tremendos. Tem vindo a crescer o uso da violência para cativar, como o mundo místico para envolver. Há realizadores históricos que têm gerado autênticos fenómenos de bilheteiras, que antecipam o mundo futuro. É obrigatório falar de Cameron, o realizador dos vários recordes. Após o filme Titanic (1997) James Cameron, após muitos anos de preparação, lança o seu último filme recordista, superando-se a si próprio. AVATAR é a nova história proposta que ilude, pelo divino, quem mergulha no mundo distante Pandora.
3. Mas o que se passa nesse imaginário mundo Pandora? Diz quem vê o filme criticamente que ele provoca sentimentos perigosos em termos existenciais e muito influenciadores para quem não está preparado. Por estranho que pareça, nos EUA a idade mínima está acima dos 10 anos; em Portugal, 6 anos foi considerada a idade ajustada. Preocupante? Diante de tal “poder”, força e fascínio do imaginário, todos os cuidados e atenções são sempre poucos…

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

O FIO DO TEMPO
Muito mais que cidadania…
1. Na data histórica de 31 de Janeiro, no Porto, deu-se início às comemorações do Centenário da República Portuguesa. Começaram, neste contexto histórico, a ser partilhadas muitas mensagens repletas de história e muitas entrevistas a personalidades do mundo da política e da cultura. Também aquelas perguntas breves de rua (sobre acontecimentos relacionados com a instauração da república e personalidades situadas nessa época complexa) manifestam grande desconhecimento da nossa história nacional, ou então um enviesamento menos saudável no que à história diz respeito. Um vasto conjunto de “refrães” enaltecedores da ideologia republicana está no ar; aquilo que é uma oportunidade cívica não se pode asfixiar em visões limitadas e circunscritas a ideias fechadas.
2. Um dos traços comuns do lançamento das comemorações é a necessidade de espevitar a intervenção cívica para aquilo que são as realidades e os problemas da sociedade em geral, e o tempo e o modo como a actividade política enobrece o compromisso público e particular com o bem comum. Das palavras mais ditas como apelo é a palavra «cidadania». Indo ao dicionário, cidadania no espírito da república pode-nos orientar mais para a noção de “cidade” que de “humanidade”. Poderíamos dizer, com as devidas limitações de todas as comparações, que a república cidadânica, inspirada na Revolução Francesa (1789), nascendo em contraposição e reacção ao modelo anterior (mais assente no “campo” que na cidade), aponta o caminho da exaltação mais de direitos de cidadania que de direitos humanos.
3. Se a república é o actual modelo de governança, este também precisa – à semelhança de outros modelos ao longo dos tempos – de ser confrontado para se ir purificando. A República nasceu com Platão, a comunidade ideal onde a todos é garantido o essencial; as repúblicas actuais, no “dia seguinte” à sua instauração, precisam de alerta contínuo para não caírem nos males que denunciaram no regime anterior. É bom sentir que só «cidadania» é muito pouco e que o «ser humano» é que é tudo! Ou seja: relativizar a ideologia, ela depende da sua prática.