quarta-feira, 3 de março de 2010

O FIO DO TEMPO
Relativização e não relativismo
1. É frequente a equiparação de “relativismo” à consciência da relativização necessária diante da fragilidade humana. Os acontecimentos tempestuosos recordam a condição humana, uma fragilidade sempre perturbadora mas inevitável. A relativização das coisas como modelo de observação da realidade ajuda-nos a diferenciar o essencial daquilo que é efectivamente secundário. É relativo o “se vamos por aqui ou por ali”, mas não é relativo que somos, existimos e que estamos chamados à realização plena. Esta abordagem orienta-nos para um plano superior, o de compreender o que queremos dizer quando se repete que “tudo é relativo”.
2. É enganador que “tudo é relativo”, e tudo depende do patamar de que falamos. Em termos de forte corrente cultural, observa-se um “relativismo” que cria escola generalizadora da diluição de valores prévios, do confundir o que é bem com o que é mal, do agarrar na subjectividade dos valores transformando-a em factor gerador mesmo de anti-valores. Após as sucessivas épocas de positivismos, as correntes de relativismo, pegando na identidade pessoal dos indivíduos como admirável dado único, têm manobrado e criado muita da escola do individualismo do Ocidente. Por exemplo, as grandes questões fracturantes que apuram razões com as bioéticas actuais reflectem o relativismo ético, fechados do qual se torna depois difícil vislumbrar rumos a seguir. Este relativismo, como novo paradigma cultural (ou mesmo especialmente sem cultura), estudando-se a si próprio asfixia-se e impede um rasgar de horizontes de exigência transformadora pessoal e social.
3. O que é que tudo isto tem a ver com a realidade diária e com as novas gerações? Embora as catástrofes naturais mostrem como somos relativos (limitados e pequenos), a verdade é que não se pode transformar esta condição de relatividade num relativismo em que tudo vale a pena, no “tanto faz como se fez”! A confusão entre relatividade da condição humana e relativismo cultural também pode ser terreno fértil a um novo “carpe diem” desmotivado e descomprometido. Isto é tudo o que não é preciso.

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